quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Das roupas que ensinamos nossas filhas a usar

Eu não sei bem se estou no caminho mais adequado da maternidade. Aliás, a dúvida é sempre a fiel companheira das mães, mas uso esse espaço para relatar para mim mesma em grande parte, as experiências da maternidade. Estamos na fase: Cecília escolhe a roupa que quer vestir. Aliás, vou logo dizendo que acho linda aquelas menininhas de vestidos com as tiaras ornando, acho mesmo, porém, Cecília não é uma dessas meninas. No começo do processo eu queria que ela usasse as roupas que eu achava mais legais, inútil, tudo virava uma grande confusão, briga e choreiro. Ela não gosta de amarrar cabelo, até gosta, mas só quando quer. E as roupas são assim. Até os 3 anos ela não usou, basicamente, nenhuma saia. Odiava. Agora ama e tal ponto de querer, em temperatura beirando zero grau, ir de saia para a escola. Mas não é só a saia, ela gosta de colocar peças sobre peças: bermuda sobre calça, saia sobre calça jeans e tudo o mais colorido possível: outro dia, foi com uma saia verde super rodada, uma calça legging bordo, meia cinza, sapato amarelo e uma camiseta branca com um bolero preto. Assim mesmo, coloridíssima. Passei na rua por algumas pessoas que a olhavam e o primeiro pensamento foi: deveria ter ajudado com a roupa hoje, mas logo em seguida eu pensei: por qual motivo? Ela ia linda, confiante e sorridente. Não se sentia constrangida, sentia-se poderosa com a escolha que havia feito. E vendo a atitude dela, refleti sobre a minha própria insegurança e ponderei que ela, muito melhor do que eu, vai olhar para o mundo como uma mulher que não se permite medir pela roupa. Ah! O que se pode aprender com as crianças.

terça-feira, 27 de setembro de 2016

Maria Evilma

Maria E. Sim é uma referência à personagem Bela B. do livro Hilda Furacão, de Roberto Drummond. Poderia narrar toda a história de nosso encontro nesse mundo, mas isso seria, por certo, muito pouco proveitoso, pois as palavras não dariam conta. Então fiz esse escrito, pois vi a foto de Maria E. careca, assim como no livro do Meninos Pelados de Graciliano Ramos que Cecília tanto gosta. Achei que fosse coincidência, mas é não. O amor tem desses melindres: um dia lá, outro aqui. E para percorrer tudo: a amizade e o querer bem de sempre.

Sempre foi de mato.
Mostrei o poema do Manoel de Barros e virou árvore.
palavras e rios ficam melhores com os que são do mato.
Tem gosto para estrepolias, Coisas de causar arrepio em gente branda feito eu, mas de braço dado atravessando a rua, a coragem era dividida. Sempre foi. Até a porta do ônibus e com o assunto longo feito a colcha da Penélope.
Arquiteta casas: de passarinhos, de gente, de cachorros. Sempre com uma cobertura de flor para todos. E para que mais serviria uma casa se não tivesse flores?
E quem escreve o mundo pela luta, escreve melhor e com mais poesia, para que o riso farfalhe como as asas da borboleta .
Sempre foi de mato, de palavra e de amor.

sexta-feira, 16 de setembro de 2016

Os caminhos de fazer crescer gente

Sou mãe. É a única coisa permanente em minha inteira existência. Mas maternar é de complexidade ilimitada, pois além do mundo, ainda lidamos com nossas próprias expectativas e fantasmas. Pois bem. Cecília fará cinco anos e as perguntas que ouço são: ela já está aprendendo escrever? ela já está em alguma atividade extracurricular? Ela....? Eu não sei ao certo o que as pessoas esperam de uma criança, aos cinco anos, eu espero o seguinte: que ela brinque, cante e dance, que ela se sinta amada, que goste dos bichos, que se suje, que imagine histórias, isso a Cecília sempre fez. Eu não  tenho angústias em relação ao futuro dela. Ela é feliz e ela tem um tempo próprio para resolver as suas questões: saiu da fralda quando quis e nunca mais voltou, nem à noite. Saiu da minha cama quando quis, volta quando tem medo de dormir sozinha. Vai em uma escola em que eles brincam o dia todo. Eu já disse em outros escritos: ela não será presidenta (ou será), eu não tenho a pretensão de que ela cresça e cuide de mim um dia. Eu quero que ela cresça e seja feliz, resolvida, do mundo e livre. Ela não lê e não escreve, mas canta, dança, borda, faz colares. A escrita é uma das muitas formas de verbalizar o mundo. Ela tem tantas e tão maravilhosas que escrever, quando chegar o tempo dela, será mais uma. E é essa é uma das muitas coisas que aprendi com ela. Ela tem o tempo dela e não é igual ao meu. O mundo para ela não tem nenhuma das preocupações que tem para mim, é um grande quintal e é assim que tem que ser. Eu quero para ela a humanidade que vem da experiência, do vivido, do sentido e isso ocorre antes das palavras, aliás, ela só terá palavras se tiver o mundo.

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

O ruído do mundo

O rangido do mundo
A maquinaria da vida
Eu respiro como quem volta à tona
Como quem quer sentir o ar
O rangido dos carros, carrinhos, ônibus, pessoas,
Uma massa de carne e funilaria se mistura na rua
Eu olho o céu
Para sentir o sol
Para ver passar o passarinho. Sem ouvi-lo
A pressa do dinheiro
Do tempo
Da vida
Que se esgota na angústia do dia que se vai
Para recomeçar
E acabar
E recomeçar
Como o relógio ponto
Eu paro como quem subverte o mundo
Para ouvir a música
Para descompensar a vota dos ponteiros
Eu paro mesmo, para as palavras da poesia

domingo, 11 de setembro de 2016

Da felicidade de um dia de sol

O sol brilha no quintal. Capino a horta, ralho com a Cecília, os morangos estão ficando vermelhos. Então, entrego-me à frágil sensação da felicidade, aquele instante em que tudo parece no lugar. Sou de entremeios, quase nunca percebo essa alegria singela em não ser ninguém: em afundar-me no cotidiano sem esperar grandes acontecimentos. Talvez seja uma fuga. Talvez medo. Mas já passei por tempestades suficientes para saber que essa calmaria pode ser só calmaria. Nada que venha antes, nada que desperte a ansiedade. Não há primeiro a felicidade para logo em seguida sermos castigadas pela infelicidade do não merecimento. Somos felizes assim, aos poucos. Por isso não me iludo: planto a horta, escrevo, planto o jardim, cuido da Cecília, escrevo. A pouca glória da rotina me é um abrigo. Canso-me facilmente das atribulações dos sujeitos empertigados, daqueles que estão sempre atrás de uma agitação, como se a calma testemunhasse alguma forma de derrota. Pois se assim é, estou eu então, derrotada. Como meu chocolate, sem ocupar-me do papel de estanho, por isso não deito tudo no chão. Já estou lá. Sinto a grama e não sou ninguém.

sábado, 10 de setembro de 2016

A mulher desiludida

Não é meu o título. É da Simone Beauvoir. Um livro com três contos sobre mulheres distintas. Voltando do centro, quase uma hora de ônibus, leio o livro e penso qual delas eu seria. Voltava da terapia e me sentia desbotada como se todas aquelas mulheres me habitassem. Não faço pergunta porque não quero ouvir as respostas. O enunciado rompeu minha frágil redoma e desejei voltar ao tempo e fazer as perguntas. Todas elas. Você me ama? Por que eu não posso ser assim? Posso ficar? Por que você não me escolheu? Você gostou do poema? Por que você me telefonou? Posso ir embora agora? Você me ama? Senti-me, então, esvaziada, como se as perguntas todas fossem as respostas. Senti-me mesmo triste por ter perdido minhas perguntas preciosas e porque as respostas não me importavam mais. Estava desiludida. O gélido fim da tarde, a chuva que insistia em escorrer, a lama grudada em meus sapatos, as pontas das roupas molhadas, as pessoas sisudas que entravam e saiam do ônibus ansiando não precisar se mexer, contornavam minha desilusão. Adornavam a quente sensação de deixar partir tantos anos de cuidados com as feridas. Se elas estavam fechadas? Qual a importância? Mesmo a mágoa é um sentimento que não passa de uma desilusão. E me senti calma. Apenas queria manter vazia minhas entranhas. Olhava a chuva, via o dia afundar-se novamente, um atropelo de angustias brotavam como mofos. Isso. Muita chuva e os mofos brotam aqui e ali. Manchando paredes. Eu estava manchada.

My heavy heart

  My heavy heart A canção do Coldplay toca no rádio do carro. Your heavy heart é feito de pedra. Você não precisa ser sozinha....voltando ...