quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Dos defeitos

(...) Arre, estou farto de semideuses! (Poema em linha reta, FP)

Gosto de gente com defeitos. Aquelas estranhezas que todos temos guardadas, mas em alguns elas parecem de forma abrupta. Gosto de gente que sai de casa de manhã desalinhado, que esquece coisas, que perde documentos importantes. Gosto, pois eu mesma sou atrapalhada e cheia de defeitos. E o tempo que eu passo tentando escondê-los me é muito custoso. Então, gosto de ver que as pessoas que me cercam, os sujeitos que amo, são, assim como eu, imperfeitos. Gauche. Esse é o adjetivo que tomo de Drummond. Gauche é ser fora do traço das estatísticas, demorar-se em decidir e, invariavelmente, escolher errado.

domingo, 29 de outubro de 2017

Sol de Santa Maria

Sou das andanças. Deve ser o sangue cigano de minha avó paterna. Há em minhas memórias: rios,  figueiras, parreirais, grandes campos verdes dobrados com os ventos, sangas, minas d'água, avencas e sol. E em Santa Maria o sol é, por força de classificação, difuso. Há uma intensidade desdobrada nos morros que cercam a cidade, criando uma espécie de caleidoscópio de pequenos raios que rebrilham por entre as árvores. E criam uma imagem para a nostalgia, para a saudade. E no silêncio de minha casa vazia o sol ia preenchendo esses lugares que não fazem sentidos por dizeres.  Minha casa. Que pronome inadequado. Quem é de andanças já não tem pronomes possessivos em narrativas de passagens aqui e acolá. Há, de certo, o contrário: despertencimento. E era esse sentimento que os raios do sol de Santa Maria curavam. Do mirante de Silveira Martins até os prados de Arroio Grande, com o vento quente de dezembro ou o sul de inverno, havia uma permanência: aquele jeito peculiar que o sol descia pelas pastagens e alagados. Não é da ordem do repetível. Só lá eu via aquele sol. O sol de Santa Maria.

segunda-feira, 17 de abril de 2017

Da passagem do tempo aos cinco anos


Fomos ao parquinho de uma cidade vizinha de Santa Maria. Caminho lindo de interior: vinhedos, gado, morros. Dois ou três meses que não percorríamos essa estrada e Cecília:

- Ai mamãe que saudades dos velhos tempos de Silveira Martins.

terça-feira, 4 de abril de 2017

Listas

Tudo é lista no mundo. Lista de 10 coisas mais interessantes, dez lugares mais lindos, melhores filmes, lista de delações, de atores. É tanta lista que tenho que fazer uma lista sobre as indicações das listas para um dia eu ler, assistir, viajar.
E aí começa o imbróglio. Eu não sou de listas. Não faço nem para supermercado (por isso preciso voltar umas duas vezes depois). Não fiz para aquelas coisas de maternidades: 32 itens indispensáveis para se levar para a maternidade (depois descobri que se resumem a dois: fralda e aqueles conjuntinhos de blusinha e calça com pezinho). Por ter uma natureza dispersa (déficit de atenção) se eu faço lista eu esqueço que fiz ou perco, ou deixo no balcão de algum móvel antes de sair. Resumindo: lista para mim é um luxo inatingível. Sim, sim, estou falando de dois tipos de listas, mas que no final das contas se prestam ao mesmo papel: sintetizar, ordenar e limitar. Acho até bem racional para o supermercado, mas para filmes, livros, músicas, etc. acho um desperdício de tempo. Só eu sei os meus filmes preferidos e eles não estão em uma lista em que um ganha do outro. Depende do contexto, das condições em que me encontro. Assim também funciona com a música: imagina eu que associo música a pessoas! Que tipo de lista seria?  Imagina ter que listar as comidas favoritas, quando todas as comidas são favoritas! Eu não sei. Pode parecer meio anarquista essa linha de raciocínio, mas listar coisas, lugares, livros, me parece tão ilógico e muito a cara dos nossos tempos: a padronização dos sentimentos. Sempre me sinto um item fora da lista, para não perder a metáfora.

My heavy heart

  My heavy heart A canção do Coldplay toca no rádio do carro. Your heavy heart é feito de pedra. Você não precisa ser sozinha....voltando ...