quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Dos roubos

Fui roubada. Na entrada do 343 PUC-Agronomia.Ônibus que tem o itinerário que vai da Rodoviária de Porto Alegre até o Campus do Vale, da UFRGS, que fica na saída para Viamão, ou seja, muito longe do centro e muito, muito longe de Santa Maria. Cinco horas. Mas não percebi na hora. De fato, fui perceber ao tentar encontrar minha carteira na bolsa, para pagar o almoço no restaurante da universidade. A primeira reação foi o pânico, depois o desespero: pânico ao descobrir que tudo de minha vida civil havia sido roubado e desespero por não ter dinheiro para pagar sequer o almoço. Gentilmente, muito mesmo, a gerente do restaurante me cedeu um número de conta, para que eu pudesse depositar o dinheiro depois. Ela viu que eu estava transtornada. Depois do susto, veio uma onda de ansiedade: procurar na casinha de descanso dos motoristas e cobradores de ônibus, ligar para a garagem da empresa de ônibus e tentar descobrir se por um milagre minha carteira não havia ficado perdida no interior do ônibus, na vinda. Não. E  o último fio de esperança se vai.  Segundos nos separam do abismo total. Então, ligar para todos os bancos, cancelar cartões, avisar os familiares  - caso alguém ligue antes - sentir medo, muito medo. E pensar: como pude ser tão distraída? Mas eis então que percebo que um mecanismo bastante utilizado pelo Estado para mascarar a seu total descaso com a segurança: a vítima é que é culpada. Não, não sou. E me nego a assumir esse rótulo. Minha carteira estava dentro da minha bolsa, embaixo do meu braço, em um lugar público onde circulam milhares de pessoas e não havia nenhum policial, nem mesmo posto da polícia e eu, por não ser portadora de RG do Rio Grande do Sul, nem mesmo pude fazer a ocorrência online. Eu sou vítima. Os bandidos são outros: a pessoa que me roubou literalmente e o Estado que não nos protege, nunca. Sim, há ainda tanta generosidade no universo e nenhuma dela é do poder público: minha orientadora que pagou minha passagem de volta para casa, a Soraia do guichê de venda de passagens (da pior empresa que já conheci - a Veppo, da Rodoviária de Porto Alegre) que ignorou falta de quatro reais para completar o dinheiro da passagem, as funcionárias da secretaria da pós que gentilmente me emprestaram o telefone e me auxiliaram, a funcionária do restaurante...E ao entrar no ônibus eu pensava que poderia ter sido muito, mas muito pior: alguém com arma, violência física. Chorei muito, por imaginar meus documentos jogados em qualquer lixeira. E pensei que as formas de violência do capitalismo não têm limites: pobres roubando outros pobres, enquanto os ricos se refestelam em praias, iates (muitos mantidos as custas do dinheiro público), cercados de seguranças por todos os lados. Só me acalmei quando entrei em casa e vi os olhinhos da Cecília, ainda acorda, feliz da vida com minha chegada. Resignada, aceitei o senso comum: poderia ter sido ainda pior.

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